01 de Outubro 2012
I
Despacho do CC ECS (a «questão dos editais» )
Sessão de TH
Tutoria (RC): Tese sobre emigração açoriana para o Alentejo (projecto Pina Manique)
II
ERIC HOBSBAWN, «the History Man» (1917-2012)
Neste final de tarde, depois da sessão de Teoria da História, ao folhear a página web do «The Guardian », uma notícia assinada por Mark Mazower «anunciava»
a morte de Eric Hobsbawm.
Cruzei com Hobsbawm (EH) algumas vezes. A mais privada foi em Reading, num almoço de véspera de natal em casa de um outro grande historiador britânico Edward .J.T. Collins, um bom amigo, hoje
Emeritus Professor of Rural History (U. Reading) . Ainda que não se achasse uma «subespécie excepcional» ( E.H.:
Años Interessantes. Una vida em el siglo XX, Critica, 2003 (ed.orig. 2002) , EH era de facto demasiado solicitado (e eu insuficientemente atrevido) para que a nossa conversa não tenha ficado limitada a uma breve troca de palavras em torno de um historiador português e de outras matérias históricas portuguesas (o colonialismo, p.ex.)
EH fez os estudos pré-universitários em Viena e Berlim, onde viveu a ascensão do Nazismo e descobriu a obra de K. Marx. Em 1936 ingressou na
Universidade de Cambridge e no grupo local do partido comunista [«me hiced comunista em 1932, aunque en realidade no ingressé en el Partido hasta mi llegada a Cambridge en otoño de 1936 (Hobsbawm, 2003, p. 125) e em particular no CUSC (Cambridge University Socialist Club) - os «vermelhos» de Cambridge, a que a campanha pró-republicana na Guerra Civil de Espanha deu grande visibilidade- e, entre os estudos, projectos editoriais ( Granta, etc) e a militancia política anti-fascista, repartia as férias entre a
London School of Economics (que então acolhia muitos refugiados intelectuais judeus e antifascistas da Europa Central: Norbert Elias, Karl Polanyi, etc) e a França (gostava de viajar à boleia na Bretanha). Em 1939 integrou a
Apostle Society ,uma sociedade secreta de intelectuais (grupo de discussão), fundada em 1820, também conhecida por « The Cambridge Apostles» ou, «Cambridge Conversazione Society», de que John Maynard Keynes também foi membro (1903, integrando o Bloomsbury Group) .
«Es fácil describir retrospectivamente cómo sentíamos y qué hacíamos como militantes del Partido cicuenta años atrás, pero explicarlo resulta mucho más difícil» (EH, 2003, p. 132). Foi militante do CPGB - Comunist Parety of Great Britain durante 55 anos, vinculo que só terminou com a extinção do partido (1920-1991). "I was a loyal Communist party member for two decades before 1956 and therefore silent about a number of things about which it's reasonable not to be silent." (Eric Hobsbawm, in
Observer special, 22 set. 2002) . Um dos episódios marcantes desta fidelidade foi o famoso panfleto que, com Raymond Williams, assinou de apoio à fracassada invasão da Finlândia pela União Soviética ( 1939-40) que o pacto Hitler-Estaline consentiu. O argumento de que Estaline estaria apenas a proteger a Rússia de uma invasão imperialista britânica correspondeu fundamentalmente a uma obediência partidária: «We were given the job as people who could write quickly, from historical materials supplied for us. You were often in there writing about topics you did not know very much about, as a professional with words.’ (cf. Raymond Williams :
Politics and letters: interviews with New left review, 1981, p.43) .
Iniciou a sua carreira académica em 1947 como «Leccturer» no Birkbeck College (universidade de Londres),de que se tornou Presidente em 2002. De 1949 a 1955 foi « history fellow at King’s College».
Com Chrsitopher Hill, Raphael Samuel E.P. Thompson e outros, EH fundou o «Comunist Party Historian Group» (CPHG, 1946-1956), um extraordinário clube (
British Marxist Historian) cujo contributo historiográfico – uma « history from below» e acessível ao povo , a que a revista
Past and Present (que fundaram em 1952) deu uma sólida feição académica -, não só revolucionou a historiografia britânica do pós-guerra e a projectou internacionalmente, como marcou toda a teoria e prática em torno escrita profissional da História ou, como gosto de dizer, dos Estudos Históricos.
Tornou-se uma referência do «marxismo cultural» ou «académico» no campo historiográfico, sendo os
Primitive Rebelds. Studies in Archaic Forns of Social Movements in the 19th and 20th Centuries (1959) um trabalho seminal. E foi, por cima de tudo,
um grande historiador, tanto na aplicação dos princípios cardinais como na arte da escrita da História. Uma parte do seu extenso legado historiográfico está traduzido em português, em particular a colecção, originalmente publicada entre 1962 e 1994, que dedicou à História do Mundo Contemporâneo (desde a Revolução Francesa):
The Age of Revolution, 1789-1848;,
The Age of Capital;
The Age of Empire; The
Age of Extremes: The Short Twentieth Century, 1914-1991. E deixou ainda uma notável autobiografia (2002), já acima referenciada e citada na edição de Espanha [
Años Interessantes. Una vida em el siglo XX, Critica, 2003.]
O quadro conceptual, instrumentos analíticos a que recorreu, as suas interpretações históricas, a forma da escrita da história tornaram-se regular objecto de debate, um debate que sempre aceitou e o tornou regularmente presente nos grandes encontos científicos da comunudade sistémica que os historiadores edificaram( Karl Dietrich Erdmann:
Towards a Global Community of Historians. The International Historical Congresses and the International Committee of Historical Sciences, 1898-2000, Berghahn, 2005).
Desde os anos 1930s cultivou o gosto pelo Jazz, um «ritmo» (e cultura) então pouco apreciado nos meios universitários britânicos, e, nas décadas seguintes, cultivou este gosto nos seus contactos com outros militantes comunistas da Europa de Leste e dos Estados Unidos. Nos anos 1950s, a figura do
crítico de jazz ganhou um espaço crescente nos jormais britânicos. EH, que já tinha prestado alguma colaboração à revista
Jazz Music, aceitou o convite (1955) para tal colaboração no
New Stateman and Nation, um jornal que tinha como leitor tipo «o clássico funcionário público, varón, de unos cuarenta e tantos años» (EH, 2003). E, como entendeu dever separar a personalidade de professor universitário da de crítico de Jazz, durante uma década, escreveu crítica jazzística com o pseudónimo de
Francis Newton. E « As ‘Francis Newton’ (named after a Communist jazz trumpeter who played on Billie Holiday’s ‘Strange Fruit’), I wrote a column every month or so for the New Statesman for about ten years.» (E.H. «Diary» ,
London Review of Books , Vol 32-10 27 May 2010; EH, 2003, p. 212). E ainda como Francis Newton publicou em 1959,
The Jazz Scene , a primeira história social do jazz na perspectiva britânica, obra reeditada em 1993 agora autorada pelo historiador.
Regressando à notícia do «The Guardian»: 'To anyone who loves history Eric Hobsbawm's death is very sad news' (Mark Mazower)
HAF